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04/05/2015

O motim do HMS Wager – Parte 1

Ancoramos na Caleta Ideal, na Ilha Wager, esperando a mudança do vento forte de NW para a travessia do Golfo das Penas, considerado o segundo lugar mais difícil de navegação da América do Sul, depois do Cabo Horn. Neste golfo é frequente um mar tempestuoso com ventos de até 100 nós (182,5Km/h). Foi nesta ilha que ocorreu “O Motim do HMS Wager”, uma aventura fantástica que entrou para sempre na história da navegação inglesa.

O HMS Wager fazia parte do esquadrão comandado por George Anson, que patrulhava a costa do Pacífico com objetivo de atacar navios espanhóis que levavam ouro de prata do Peru para a Europa. O navio perdeu contato com o esquadrão nas imediações do Cabo Horn em 1741. Seu capitão David Cheap buscava abrigo na ilha Socorro, hoje conhecida como Ilha Guamblin, a 180 milhas de onde ancoramos. Parte da tripulação estava com escorbuto e o comandante precisava de um lugar para ancorar seu navio para a recuperação de seus marinheiros. Ele precisava dos marinheiros para manobrar o navio.

Um dos oficiais, John Bulkley, foi contra a decisão do comandante, dizendo que poderiam navegar e encontrar os outros navios do esquadrão na ilha Juan Fernandez, ponto de encontro a 800 milhas e que ficava longe da costa, ao contrário da ilha Socorro, que ficava perto da costa. Eles não tinham carta náutica precisa do local e seria um alto risco para segurança da embarcação.

Bulkley era oficial e artilheiro e era reconhecido como o melhor e mais capaz do navio. Ele tentou de todas as formas convencer o comandante a mudar de ideia dizendo que o navio e a tripulação não estavam em boas condições, e que o mais prudente seria navegar longe da costa. O oficial tinha razão, mas o comandante não atendeu o seu apelo.

Em 13 de Maio 1741, às 9h, o carpinteiro John Cummins foi à proa inspecionar o navio. Ao olhar o horizonte, teve a impressão de ter visto terra a oeste. O tenente, Baynes, também estava no convés, mas não viu nada, e a observação não foi notificada. Na época essa informação era importantíssima e deveria ser imediatamente comunicada ao capitão. Eles acharam que era impossível ter visto terra.

O navio entrou em uma grande baía, hoje chamada de Golfo das Penas, com mais de 50 milhas (92Km) de extensão. Às 2 horas da tarde foi avistada terra a oeste e noroeste.

Imediatamente mudaram o rumo para sudoeste. Nesta brusca manobra o comandante caiu da escada e deslocou o ombro. Machucado, ficou sem poder comandar o navio.

À noite, abateu uma terrível tempestade, com o navio em péssimas condições e a maioria dos tripulantes sem forças para manobrar as velas. Foi muito difícil tirar o navio da situação que encontrava dentro da baía, sem saber onde estavam por não terem cartas náuticas da área.

Às 4:30 horas da manhã, o navio bateu repetidamente em rochas, quebrando o leme e provocando um furo. Os que estavam doentes e inválidos no fundo do navio não puderam se mover e se afogaram. Bulkley e outro marinheiro, John Jones, tentaram navegar somente com as velas, sem o leme, colocando a embarcação em direção à terra. Neste novo rumo, o navio bateu novamente nas pedras da Ilha Wager. Alguns tripulantes, no desespero, invadiram o deposito de bebidas e se embebedaram. Mesmo com toda dificuldade, chegaram em terra com segurança 140 marinheiros e oficiais.

Todos estavam desesperados, porque estavam longe de tudo em terras desconhecidas, com pouca comida, era início do inverno e não havia recursos naturais para sobreviverem. A tripulação se dividiu perigosamente. Apontaram como culpado pela situação o capitão.

No dia seguinte, sexta-feira 15 de maio, muitos da tripulação se embebedaram ainda mais. Alguns tripulantes do Wager liderados por John King, o contramestre cuja personalidade era de rebelde, abandonaram o navio. A tripulação retirou do navio o que pode, como tecidos indianos para adicionar nos abrigos improvisados.

A grande quantidade de rum foi um problema, já que muitos dos tripulantes estavam sempre bêbados e de difícil de controle. Foi construída uma escuna sem cabine, aberta, que chamaram de Speedwell e, no dia 13 de outubro de 1741, os amotinados colocaram velas e navegaram rumo ao estreito de Magalhães, com 81 homens.

O comandante David se recusou a embarcar, para alívio dos amotinados. Ele disse que iria ficar. Com ele ficou um pequeno número de tripulantes e seguidores leais. Todos que estavam na escuna tinham certeza de que o comandante iria morrer naquela isolada ilha, distantes do mundo e sem comida. Se os amotinados chegassem na Inglaterra assim seria mais fácil explicar o ocorrido. Bulkley assumiu isso no seu diário escrevendo: “Esse foi o derradeiro dia que vejo vivo o comandante.”

Volte amanhã para ler a parte final do relato histórico :-)